Talvez
Tudo está gelado.
E eu apenas gostaria de um café quente, qualquer coisa que aqueça minha alma. Um suspiro breve, um profundo pesar. Mas das paredes frias ecoa meu silêncio, brando, branco como neve. O sol indiferente que banha a cama negligencia minha solidão. Nem mesmo este é capaz de aquecer essa manhã tão cortante. Eu fico aqui, ora sentado, ora correndo, vou da porta à janela. Fico aqui, olhando o gato e esperando a vida passar. Estaria eu preso em mim mesmo? Quero tudo, quero ao mesmo tempo. Tento preencher este enorme vazio com qualquer coisa. Algo que inale, que transpire, algo que queime e arda meu sangue.
A vida parece bem simples afinal.
E sempre há momentos nebulosos. Ou talvez isso seja tudo que há. Mas e aquela fagulha? Um lampejo de esperança que nos arrebata, com um brilho no olhar e o coração pulando. Então tudo se encaixa, tudo faz sentido. E nesse instante não há nada além do agora. E uma esperança que, eu sei, é faca de dois gumes. Nas profundezas do meu ser eu vejo que é exatamente o que preciso. A lágrima que agora escorre é agridoce pois sei que irá secar. E vejo que, por mais que queira, não consigo manter nada. Não, não agora. Talvez depois
Talvez não seja sobre manter.
Talvez, seja esta a correnteza na qual estamos presos, e estamos destinados a aceitar o fluxo das coisas. Nos aceitarmos, e entender que não podemos parar o rio, e que as duas únicas opções são seguir em frente, ou se afogar. E, acredite, a cada curva nosso destino se renova. Como uma carta aleatória escolhida num baralho de possibilidades. A cada segundo, temos um segundo a menos. Não temos o que passou. Não temos o que ainda não chegou, e o presente se alterna numa frequência imensurável. Não temos sequer um segundo para chamar de nosso, e ainda assim nos apegamos tanto. Sentimos tanto medo. Ficamos tão desamparados quando percebemos que não estamos no controle de tudo.
Um dia de cada vez.
Amanhã já é outra história. E a nós, a nós apenas cabe narrar o tanto que nos será permitido…